Paraná

Cultura

Festivais e mostras culturais habilitados ainda não receberam dinheiro via Lei Paulo Gustavo

O edital 003/2023 que prevê a produção de festivais e mostras foi judicializada pela maior produtora do estado

Curitiba (PR) |
A Lei Paulo Gustavo é uma medida emergencial direcionada a microempreendedores da cultura que tiveram suas atividades interrompidas por causa da pandemia da Covid.-19. - Foto: Anderson Tozato / SEEC PR

Por Vanessa Ricardo, para o Jornal A Cena

A classe artística paranaense continua passando por maus bocados, como se já não bastasse a pandemia que parou por mais de dois anos a produção artística em todo o país. Fazer arte no Paraná, está cada vez mais difícil. A ser pelo atraso de editais como o Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura (Profice), ou a judicialização de editais que brecam o repasse da verba para projetos já aprovados.

Essa segunda situação é o caso de eventos como a 3ª edição da Mostra Claudete Pereira Jorge, que tinha previsão de acontecer daqui a dois meses, além de eventos como o 1º Festival de Teatro de São José dos Pinhais,  Grupo Dia de Arte, de Ponta Grossa e a TELÚRICA - Festival Feito por Palhaças - 3ª Edição, conforme resultado do Edital Paraná Festivais, da Lei Paulo Gustavo.

São, ao todo, 24 festivais e mostras culturais, que estavam habilitados no edital, fruto de uma lei emergencial. Após aprovados e com documentação enviada os projetos foram surpreendidos: no dia 19 de janeiro de 2024, a Parnaxx, produtora do maior evento de artes cênicas do Paraná, entrou com um pedido de mandado de segurança, questionando a nota recebida pelo seu projeto no referido edital. A Parnaxx, que realiza o Festival de Curitiba, há 32 anos, recebeu uma nota de 73.5, ficando na 77ª posição na classificação geral, bem atrás dos 24 projetos contemplados e habilitados.

“É bem triste, em especial porque o mandado de segurança não foi solicitado por uma produtora pequena ou média, como as nossas”, conta Igor Augustho, coordenador de produções da Pomeiro Gestão Cultural, responsável pela Mostra Claudete. “É uma produtora que, com certeza, vai ter a próxima edição do seu evento - ainda que reduzida - garantida, pois tem dinheiro para isso e capta através de outras fontes, enquanto nós temos pouquíssimas chances de financiar nossas propostas”.

Outro ponto a se destacar, é que o edital prevê verba de R$4.779.292,96, que veio através da Lei Paulo Gustavo, lei emergencial direcionada para cultura, voltada a microempreendedores individuais, micro e pequenas empresas e instituições que tiveram suas atividades interrompidas por causa da pandemia da Covid-19. Aqui vale reforçar que durante 2019 a 2024 a Parnaxx - e outras empresas que representam seus eventos junto à Lei Federal de Incentivo à Cultura, a “Lei Rouanet” - captou um total de R$14.289.630,40. O valor é bem superior ao total do edital Paraná Festivais, que será dividido entre os aprovados. Cada um dos projetos aprovados não receberá, sequer, mais do que 315 mil para a realização de seus eventos.

Segundo dados disponíveis publicamente na plataforma VERSALIC (que assegura acesso à informação acerca de projetos financiados com recursos da Lei Federal de Incentivo à Cultura) comprovam que os projetos Festival de Curitiba e Fringe captaram, ao menos  desde 2019 R$14.289.630,40, sendo: Festival de Curitiba - 32ª edição - PRONAC 234537 captou R$3.105.947,75; Fringe 2024 - Pronac 236355 captou R$3.946.962,75; Fringe 2023 - Pronac 222525 captou R$1.787.000,00 e Fringe Pronac 193433  captou R$5.449.720,41.

​O total captado equivale, em apenas cinco anos, a quase três vezes o valor total disponibilizado pelo edital Paraná Festivais, para todos os projetos contemplados. Considerando-se que não houve edições presenciais do Festival de Curitiba nos anos de 2020 e 2021, pode-se estimar que cada edição do evento realizada entre os anos de 2019 a 2024 captou em média R$3.572.407,60 (excetuando-se, ainda, valores captados pelas demais atividades do Festival, como Gastronomix e Guritiba, que também possuem captações nos últimos cinco anos, em projetos específicos). Cabe-se ainda notar que, dos quatro projetos acima listados, apenas o primeiro foi proposto à Lei Federal de Incentivo à Cultura pela Parnaxx, enquanto o segundo e terceiro foram propostos pela empresa Ápice-associação para o Incentivo da Cultura e Entretenimento e o quarto pela Araucária Produções Artísticas.

Em contato com a assessoria de imprensa da Parnaxx, o Jornal A Cena foi informado, com exclusividade, que o mandado de segurança foi aberto pelo mesmo motivo do edital 002 de Audiovisual. Há, contudo, uma diferença: o referido edital não foi judicializado, como feito pela Parnaxx. Naquela situação em específico, havia projetos que foram prejudicados, pois alguns deles estavam sem as cinco notas totais dos pareceristas, em alguns casos com pareceres iguais para projetos diferentes. Nenhuma produtora concorrente, contudo, travou o edital em função do descontentamento em relação às notas atribuídas. Em contato com a Parnaxx foi informado que a empresa iria se manifestar através de uma nota divulgada para a imprensa, mas até o fechamento desta matéria não tínhamos recebido a tal nota.

A produtora cultural e atriz Aline Gonçalves, que teve o projeto do 1º Festival de Teatro de São José dos Pinhais habilitado, também corre o risco de atrasar com seu projeto. “Eu vi no edital Paraná Festivais uma possibilidade da realização do evento, que apesar da idade da cidade, e de ter um movimento cultural já estabelecido, nunca teve um festival voltado às artes cênicas. E a ideia do evento é de reunir e valorizar  o trabalho das companhias locais, além de trazer companhias de outras cidades. Como será a primeira vez que o festival acontecerá, nós dependemos 100% do dinheiro previsto do edital”, Aline também lembrou, que além de ajudar no fortalecimento da classe artística da cidade, a realização do festival irá impactar de forma positiva o município, gerando emprego e renda, beneficiando a economia criativa da região.

Na segunda-feira, 22 de abril, o Desembargador Luiz Taro Oyama revogou o mandado de segurança, de acordo com o agravo, “faltou informações detalhadas, parece ter sido a pecha do projeto da impetrante que, desta forma, não recebeu a pontuação máxima, conforme esposado pelos julgadores, por ocasião da atribuição da nota, bem assim da prolação das decisões de indeferimento da insurgência administrativa”.

O Grupo Dia de Arte, de Ponta Grossa, comemora em 2024, 10 anos de existência e realizaria em junho a mostra de repertório, voltada para crianças e adolescentes da rede de ensino público da cidade. Para David Dias, o criador do grupo e proponente do projeto, ficar sabendo do mandado de segurança foi muito frustrante. “Já havíamos feito o agendamento das datas do teatro para a realização do festival. Infelizmente teremos que reagendar, pois não há mais tempo hábil para fazer. Além do todo trabalho e planejamento que tínhamos feito, muitas pessoas que estavam envolvidas foram afetadas, pois já estavam trabalhando na concepção de cenário e figurino. Não prejudicou só o nosso grupo, mas sim toda uma cadeia de produtores culturais”, disse David.

Em contato com a Secretaria de Estado da Cultura, a reportagem foi informada que o processo do lote 02 está pronto para pagamento, e que as certidões estão sendo atualizadas para a realização de repasse das verbas. Também informaram que na tarde de dia 25, iriam definir se o projeto de Festas Populares que deveria ter sido selecionado no edital 003 entra neste lote.

Edição: Mayala Fernandes