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Se não agora, quando? Pelo Fechamento do Hospital São Vicente de Paulo!

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"Movimento de fechamento de instituições manicomiais deve se expandir ao Hospital São Vicente de Paulo e às Comunidades Terapêuticas" - Foto: Jhonatan Cantarelle/Agência Saúde-DF
Temos uma oportunidade única para acabar com os manicômios no DF

Recentemente, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF) anunciou a intenção de fechar o Hospital São Vicente de Paulo (HSVP) que, além de ilegal, é um serviço manicomial. A iniciativa tenta garantir que a Resolução nº 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de 15 de fevereiro de 2023, seja efetivada.

A Resolução instituiu nacionalmente a Política Antimanicomial do Poder Judiciário e estabeleceu procedimentos e diretrizes para implementar a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência e a Lei nº 10.216/2001.

A princípio, no Distrito Federal, tal Resolução se volta especificamente para a Ala de Tratamento Psiquiátrico (ATP), que fica no presídio feminino - conhecido como Colmeia. Porém, para o devido cumprimento da Lei nº 10.216/2001 e da Lei Distrital nª 975/1995, que fixa diretrizes para a atenção à saúde mental no Distrito Federal, o movimento de fechamento de instituições manicomiais deve se expandir ao HSVP e às Comunidades Terapêuticas.

Assim, recebemos com alegria a notícia de criação de uma comissão para atuar na desinstitucionalização de pacientes em sofrimento psíquico no DF, pois, para que tal desinstitucionalização realmente aconteça, deve obrigatoriamente envolver um plano de fechamento da ATP e do HSVP.

Temos, então, uma oportunidade única para acabar com os manicômios no DF, fortalecer a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e a assistência às pessoas em sofrimento psíquico em nossa região.

No entanto, a forma como foi constituída a Comissão de Desinstitucionalização em Saúde Mental nos traz algumas preocupações. De acordo com o seu documento de instituição (Portaria SES/DF nº 407, de 16 de outubro de 2023), essa comissão tem natureza consultiva, deve realizar estudos e acompanhar as tratativas relacionadas à desinstitucionalização de pessoas em sofrimento psíquico, como as que estão internadas há muito tempo no HSVP e no Instituto de Saúde Mental (ISM), por exemplo.

:: Por que o Hospital São Vicente de Paulo ainda existe? ::

Além disso, deve fornecer subsídios técnicos para a formulação, avaliação e implementação de políticas de saúde. Com tantas atribuições que afetam a vida dos usuários e de seus familiares, é de se imaginar que este público tenha representatividade na comissão, assim como ocorre nos Conselhos de Saúde, nos quais 50% dos integrantes são representantes dos usuários. Mas esta não é a realidade.

A Portaria nº 407 determina que a Comissão de Desinstitucionalização em Saúde Mental seja composta apenas por servidores de várias áreas do GDF, tais como: Diretoria de Serviços de Saúde Mental, Gerência de Serviço Social, HSVP, ISM, Hospital de Base, Ala de Tratamento Psiquiátrico e alguns CAPS (Centros de Atenção Psicossocial). Ou seja, os movimentos sociais da Luta Antimanicomial, os usuários da saúde mental e seus familiares não possuem representantes na comissão e, por consequência, não têm voz para opinar em decisões que afetam diretamente suas vidas.

Solicitamos, assim, a inclusão de usuários dos CAPS e demais serviços da RAPS e familiares nas discussões e processos decisórios da Comissão e/ou a criação de meios de participação destas pessoas que também constroem a saúde mental no dia a dia.

O processo inicial de desinstitucionalização visa encaminhar, para os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRTs), pessoas que requerem cuidados em saúde mental e que estão internadas há mais de dois anos na rede pública, em virtude de laços fragilizados ou rompidos com seus familiares e falta de suporte financeiro.

Os SRTs, ou residências terapêuticas, são serviços de cuidado territorial em liberdade previstos na RAPS, que funcionam 24 horas e oferecem moradia para essas pessoas. Nessas residências, os moradores irão contar com cuidadores, além de equipe de enfermagem, de cozinha e de serviços gerais, e o apoio de outros serviços da RAPS, como as Unidades Básicas de Saúde (UBSs), os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), etc.

No entanto, o DF não tem nenhuma residência terapêutica - algo inaceitável. Atualmente, está aberto o Edital de Credenciamento nº 18/2023, que prevê a contratação de 100 vagas em residências terapêuticas a serem implantadas no Riacho Fundo II, em Samambaia, em Taguatinga e no Paranoá.

Já que o edital prevê uma parceria público-privada, sendo que o ideal seria a gestão das SRTs pelo próprio GDF, esperamos, ao menos, que tais residências sejam inauguradas e que sejam gerenciadas por instituições não-manicomiais.

Não aceitamos Comunidades Terapêuticas ou demais organizações manicomiais gerindo serviços não manicomiais, como as residências terapêuticas!

Colocamos estas preocupações para fortalecer o processo de desinstitucionalização no DF. Para que ele, de fato, aconteça. Temos uma oportunidade de ouro para fechar o manicômio público ilegal que é o HSVP, a partir de um plano que se oriente a criar e fortalecer níveis de atenção, serviços e equipes que compõem a RAPS e a saúde mental no DF.

Se não agora, quando?

Já são quase 28 anos da Lei Distrital 975/1995 e 24 anos do seu descumprimento!

Já são 22 anos de descumprimento da Lei 10.216/2001!

Não há cidadania das pessoas se elas estão submetidas à privação!

Não há desinstitucionalização com a manutenção do Hospital São Vicente de Paulo!

Pelo fechamento do Hospital São Vicente de Paulo!

:: Leia outros textos desta coluna aqui ::

*Fernanda Periles, Daniel Monteiro, Sara Figueiredo e Pedro Costa são membros do Grupo Saúde Mental de Militância do Distrito Federal UnB.

**Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

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Edição: Flávia Quirino