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A Guerra das Toalhas

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"Apesar do sucesso, uma coisa incomodava Valdo: Bolsonaro estava vencendo no seu DataToalha." - Reprodução
"Não deu outra: as vendas do ex-presidente dispararam e a esquerda virou o jogo."

Brasília pode não ter ruas comuns, mas suas esquinas e calçadas estão cheias de empreendedores ambulantes em busca de sobrevivência, como todo o Brasil de Meu Deus.

Numa dessas esquinas, Valdo vende capinhas de celular em sua banquinha. Com o clima acirrado das eleições, o ambulante lulista expandiu os negócios para as toalhas. Dobrou o faturamento com as peças de Lula e Bolsonaro. Apesar do sucesso, uma coisa incomodava Valdo: Bolsonaro estava vencendo no seu DataToalha. Ok, Bolsonaro vencia com folga em Brasília, nenhuma novidade desde 2018. Mas nas últimas semanas do 2º turno, o placar estava em 87 toalhas para Bolsonaro e 52 para Lula.

As toalhas de Bolsonaro decoravam sozinhas a quadra dos militares, onde fica o ponto de Valdo. Seria um DataToalha com viés ideológico?

Do outro lado da esquina a quadra vizinha, claramente de maioria esquerdista, equilibrava um pouco o jogo. Jovens hipsters andavam com seus pets pelos arredores e sempre paravam para comprar uma toalha do Lula de presente para alguém. De preferência aquela do ex-presidente com óculos juliet. Às vezes a venda também vinha casada com uma capinha vermelha, para a alegria de Valdo. Mas a quadra vizinha não é unânime como a dos milicos. Próximo às toalhas de Lula penduradas nas janelas dos prédios, sempre há uma bandeira do Brasil ou a toalha do Bolsonaro, saídas geralmente da banquinha do ambulante.

Valdo andava perturbado por ajudar a estampar a cara do "tchutchuca do Centrão" por aí. Resolveu então botar fogo na lenha e incentivar a polarização. Fazer o povo do Lula comprar mais seria a solução para os negócios e para sua consciência pesada.

Valdo começou a escrever o placar do seu DataToalha na frente da banquinha. Não deu outra: as vendas do ex-presidente dispararam e a esquerda virou o jogo. A quadra vizinha dos milicos também se organizou pelos grupos de zap para virar o placar. Os síndicos tentaram aprovar em assembleia um regulamento que proibia as toalhas nas janelas, fossem quais fossem, mas geral queria ver o "cabaré pegando fogo" e a proposta não colou.

Claro que Valdo não ia parar por aí.

Ampliou sua oferta de produtos para bandeirinhas de carro. Vendia as do Bolsonaro e as do Lula. É claro que o bolsonarismo se apropriou da bandeira do Brasil como peça de campanha, mas o visionário Valdo sabia que era questão de tempo: depois da eleição é Copa e o estoque estava garantido pra todo mundo.

A estratégia para alavancar as vendas era a seguinte: o ambulante distribuía adesivos e conselhos indecorosos para os pequenos guerrilheiros da quadra vizinha pregarem a palavra nas bandeirinhas dos bolsonaristas. Deixaram a vizinhança conservadora em polvorosa. Já não bastava a virada por 137 à 122 no DataToalha, agora os esquerdistas estavam destruindo as bandeirinhas com os adesivos. Não adiantava tirar. Pode arrancar, sempre fica um pedaço. Valdo jurava de pé junto não ter nada a ver. Mas as vendas das bandeirinhas dispararam. Obsolescência programada.

Na véspera do 2º turno, a coisa ganhou volume. Adesivos de Lula e Bolsonaro estavam em todos os lugares. Na lataria dos carros, nas bandeirinhas, nas colunas dos prédios. Só não estavam nas toalhas porque ninguém ali era escalador.

E o negócio do ambulante a todo vapor. "Podia ter eleição todo ano". O placar estava apertado, 6 pontos de vantagem para Lula e sem margem de erro.

Com o faturamento da empreitada, Valdo já podia dar entrada no Minha Casa Minha Vida em 2023. Sonhava há anos com uma casinha branca de janelas azuis. Afinal, casa verde e amarela é cafona pra caralho.

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*Diego Ruas é escritor, designer e engenheiro florestal.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

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Edição: Flávia Quirino