Distrito Federal

Coluna

Isso tudo é verdade, ou não

Imagem de perfil do Colunistaesd
Espetáculo O Segredo no projeto Estação Dulcina, 2018. - Foto: Matheus Alves
Acreditar e fazer acreditar que existe um céu e um inferno é a melhor maneira de manipular os fiéis.

Abril começa com o dia da mentira. Existem muitas versões sobre a origem dessa - digamos - celebração, e isto não será o foco deste texto, mas sim a associação que muitos fazem do teatro com a mentira, ou melhor, que ator mente muito bem. De um lugar muito suspeito, afinal somos uma companhia de teatro, podemos dizer que isso é uma tremenda injustiça.

E explicamos o porquê. Para que uma atriz ou ator expresse seus sentimentos enquanto personagem, é preciso acreditar neles. É sabido no métier teatral, que se o elenco não acredita no que está sendo dito, a plateia também não acreditará. É o que chamam de fé cênica. Expressão perigosa, já que carrega um termo cristão duvidoso. Afinal, acreditar e fazer acreditar que existe um céu e um inferno é a melhor maneira de manipular os fiéis.

Como não consideramos nossa plateia como fiéis, e sim como sujeitos críticos do evento teatral, a última coisa que queremos é manipular. Na realidade, há muito tempo estamos tentando combater a mentira por meio de nossos espetáculos. Antes mesmo de sermos governados pelas fake news, montamos em 2015 uma peça chamada "O Segredo" baseada no conto O Segredo do Bonzo do escritor Machado de Assis para falar da manipulação da informação.

Quase como uma previsão de vidente - olha a gente usando termos capciosos para exemplificar nossa fala -, o espetáculo levou para os palcos a  “doutrina pomadista” a qual determina que o que importa é a opinião e não a realidade. Focamos na maneira como a manipulação da opinião é forjada e tratada por certos intelectuais, filósofos, jornalistas e políticos, para vender mentiras como verdades. Não precisamos nem citar nomes para sermos críveis.

Então, a arte imita a vida ou a vida imita a arte? Para nós é uma coisa só. É como dissociar o ser humano do ambiente ou a mente do corpo. Augusto Boal, um dos nossos mestres - novamente caindo na cilada de usar termo que leva ao engano, de guru o inferno já está cheio -, já dizia: o teatro é um ensaio da revolução. Ou seja, estamos o tempo todo ensaiando e representando a realidade.

Para finalizar, em nossa defesa poderíamos citar o trecho bíblico "conheça a verdade e elas vos libertará", mas seria muito cinismo de nossa parte, no entanto preferimos citar outro de nossos teatrólogos - vejam que dessa vez utilizamos um termo menos corruptível -, Bertolt Brecht: "Aquele que não conhece a verdade é simplesmente um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este é um criminoso".

Epílogo. Pedimos licença para algumas palavras, apenas para frisar que o texto acima pode ser uma ficção baseada na realidade ou uma realidade fictícia, ou apenas uma simples realidade. Ou uma grande mentira. Uma contradição. Na verdade, quem decide é você, plateia.

:: Leia outros textos desta coluna ::

*A Cia Burlesca é uma companhia de teatro político do Distrito Federal.

**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato DF.

:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::

 

Edição: Márcia Silva