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Influência

Eleição da OAB-DF confirma hegemonia política de mais de duas décadas

Vinculadas a grandes escritórios, chapas mais votadas se revezam no poder desde 1998

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Reeleito, atual presidente da OAB-DF representa um dos grupos políticos que se revezam na direção da entidade há mais de 20 anos - Divulgação/OAB-DF

A eleição da nova diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Distrito Federal (OAB-DF) foi realizada no domingo (21) com a vitória do atual presidente da entidade, Délio Lins e Silva Júnior. À frente da chapa Avança Mais OAB, ele recebeu 12.328 votos (41% dos votos válidos) e garantiu mais três anos de mandato (2021 a 2024).

Em segundo lugar, com 9.192 votos (31% do votos válidos), ficou a chapa Você na Ordem, liderada por Thais Riedel, apoiada pelo governador Ibaneis Rocha (MDB), que já presidiu a OAB-DF. As outras três chapas concorrentes somaram pouco mais de 18% dos votos válidos, com cerca 5,5 mil votos, com destaque para a chapa de oposição progressista liderada por Renata Amaral, que obteve quase 3 mil votos (9,9% dos votos). Ao todo, 29,5 mil advogados votaram no pleito, que este ano foi totalmente virtual. 

Em comum, as duas chapas mais votadas, conhecidas pelas cores verde e laranja, têm o histórico de se alternarem no poder há mais duas décadas, desde 1998.  O grupo laranja, atualmente liderado por Délio, já teve como principal nome o advogado Francisco Caputo, presidente da OAB-DF entre 2010 e 2012, além de J. Safe Carneiro, presidente da entidade entre 1998 e 2003.  

Já o grupo verde, de Thais Riedel, esteve à frente da OAB-DF em quatro gestões desde de 2004. A primeira liderança desse grupo foi de Estefânia Viveiros, presidente da seccional DF entre 2004 e 2009. O governador Ibaneis Rocha, que emergiu como liderança política a partir da OAB-DF, dirigiu a entidade entre 2013 e 2015. O grupo verde ainda teve na presidência o advogado Juliano Costa Couto, entre 2016 e 2018. 

"Eles vão se revezando, mas sem sair muito disto. Representam os grandes escritórios e uma política mais conservadora. Nos temas principais da política ficam em cima do muro", aponta o advogado Jônatas Moreth, que foi um dos integrantes da chapa Nossa Ordem Democrática, liderada por Renata Amaral. 

Campanhas milionárias

Outro aspecto comum entre as duas principais chapas são as campanhas milionárias. Não há muita transparência nesses gastos durante as eleições, mas estimativas de quem acompanha o processo de perto indicam que esse valor varia de R$ 5 milhões a R$ 7 milhões.


Délio Lins realizou festa de encerramento da campanha no dia 20 de novembro em churrascaria na Asa Sul de Brasília / Divulgação

Um exemplo ilustra bem a opulência das campanhas. A chapa de Thais Riedel passou investigada pelo Ministério Público do DF (MPDFT) por perturbação do sossego em sua campanha, como revelou o portal Metrópoles, em outubro. Ela foi alvo de uma denúncia anônima de uma pessoa que mora no Lago Sul, área nobre da capital, por causa do barulho e movimentação nas festas frequentes em sua casa. Festas de arromba com open bar e música ao vivo estão entre as principais estratégias das grandes campanhas para angariar apoio durante as eleições. 

O volume de recursos arrecadados durante as campanhas, ao menos oficialmente, é fruto de doações dos próprios advogados apoiadores e integrantes dos grupos políticos. Como as principais chapas são formadas por grandes escritórios, não chega a ser difícil chegar a cifras milionárias. O próprio governador Ibaneis Rocha possui uma fortuna em patrimônio, em 2018 ele declarou ao Tribunal Superior Eleitoral bens que ultrapassam a ordem de R$ 94 milhões. 

Mesmo assim, o abuso de poder econômico parece evidente nas eleições da Ordem. Nem mesmo nas eleições gerais do país, atualmente, permitem o gasto indiscriminado com festas e eventos desse tipo.

Uma outra contradição é que a própria OAB foi quem ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) para proibir doações de empresas a candidatos e a partidos políticos, há 10 anos. O STF julgou favorável e, em 2015, a proibição finalmente declarada pela corte. Outro aspecto é que o mandato na OAB é voluntário e não paga salário. 

"É que para quem ganha é um investimento. Principalmente para os advogados criminalistas que costumam ser os mais ricos. Os escritório ficam em evidência e eles ampliam o número de clientes", aponta Joanas Moreth.

Vitrine

As eleições da OAB também chamam a atenção por despertar um interesse público que nenhuma outra entidade de classe consegue.

Ao longo das eleições, por exemplo, sabatinas, entrevistas e debates promovidos por veículos de comunicação são comuns. Entidades de classe de médicos, engenheiros, psicólogos, entre outras categorias representativas, não chegam nem perto dessa visibilidade.

"A OAB é uma potência do ponto de vista da visibilidade. No DF, por exemplo, representa mais de 60 mil pessoas. Se fosse um sindicato, seria um dos maiores da capital do país. Tem força social e força política, veja a quantidade de advogados que estão no Parlamento. A OAB também tem cadeiras em praticamente todos os conselhos de políticas de fiscalização do poder público, de combate a tortura, direitos humanos, etc.", afirma Moreth. 

A OAB é praticamente a única entidade de classe com capacidade postulativa de Ações Direta de Inconstitucionalidade. Conta ainda com muita força na postulação de iniciativas judiciais de peso, como ações civis públicas e de fiscalização do poder público. O papel da entidade também é histórico em qualquer discussão de projetos relevantes, como reformas tributária, previdenciária e política, por exemplo, sem contar o papel na proposição de pedidos de impeachment de presidentes da República.

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Edição: Flávia Quirino