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Coluna

Ibaneis leva um “toco” do IPHAN

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Setor Comercial Sul - DF - Pedro Ventura/Agência Brasília
Estima-se que o SCS conte hoje com 101 lojas e 680 salas fechadas, sem funcionar.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) praticamente sepultou o sonho de Ibaneis e de seu Secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação (SEDUH), Mateus de Oliveira, de transformar o SCS (Setor Comercial Sul) em área de especulação imobiliária altamente lucrativa para os proprietários de imóveis da região. 

O projeto, chamado “Viva Centro”, esconde a volúpia por valorização patrimonial por trás de todo uma fraseologia falso-progressista... de “revitalizar a região central de Brasília, abrindo a possibilidade de reservar uma cota para a moradia popular, estimular a economia criativa e a economia local”.  

O GDF já havia conseguido tal flexibilização para o Setor de Indústrias Gráficas, mas para o SCS o IPHAN “colocou o pé na porta”, mostrando que o Viva Centro (nome do projeto), da forma em está concebido, favorece à gentrificação (elitização) da região e ainda estende para o local, o conflito entre unidades residenciais e a vida cultural noturna. 

Ibaneis tenta de todas as formas desconhecer as novas condições sociais, econômicas e sanitárias colocadas pela pandemia e toca febrilmente obras de trânsito,  como viadutos, e privatiza equipamentos públicos, como ocorreu com o complexo esportivo Mané Garrincha, e agora tenta fazer o mesmo com o CAVE, no Guará. 

Com o “Viva Centro”, Ibaneis buscava valorizar os imóveis da região com esse suspeito projeto da lavra da SEDHU, cujo titular é sabidamente vinculado ao mercado imobiliário.

Estima-se que o SCS conte hoje com 101 lojas e 680 salas fechadas, sem funcionar. Imóveis ociosos que podem, sim, cumprir uma função sócio-econômica dentro das características culturais e urbanísticas do Setor, já previstas na legislação. 

Se os imóveis ali estão se desvalorizando é porque a crise do COVID está colocando à prova o verdadeiro preço desses espaços, cuja valoração em reais deveria levar em conta tão-somente a quantidade de trabalho vivo e trabalho morto incorporado a cada construção. 

Anabolizar esse valor por meio de manobras espertas de quem está no governo, exclusivamente  para favorecer os proprietários (muitos donos de dezenas de unidades de salas, lojas e até prédios inteiros), é um iniciativa a ser rechaçada, como muito bem fez o IPHAN, em parecer de 8 de junho deste ano.

 A Realidade de Brasília que o Palácio do Buriti não quer ver: Sem-Teto, Pobreza e Exclusão

Os indicadores de pobreza e extrema pobreza estão se agravando a olhos vistos na Capital do Brasil. A FGV, em recente levantamento, mostrou que esses índices deram um salto recorde aqui no DF. Foram 7,9 pontos percentuais a mais na faixa de pobreza (incluindo a extrema pobreza), do primeiro trimestre de 2019 a janeiro deste ano, quase o dobro do crescimento médio nacional de 4,3 p.p.

Pela fila de novos cadastramentos nos CRAS em Brasília, o número de famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza já deve ter batido 300 mil núcleos familiares. A maioria em situação de extrema pobreza, ou seja, vivendo com uma média de 10,45 reais (ou menos) per capita/dia. 

E essa maioria está fora do foco de preocupação do GDF em todos os sentidos. Não há renda básica, renda emergencial e muitos vivem de favor, despejados por não poder pagar aluguel, em condições precárias ou até na rua. 

O Habita Brasília, do GDF, não tem preocupação com essa faixa da população, que nos manuais normativos estão incluídos na faixa 1 dos programas habitacionais.

Esse procedimento de só contemplar a lista da CODHAB por meio do acesso a unidades construídas por empreiteiras - ou cooperativas capitalistas - NÃO FUNCIONA para essa faixa proletarizada da população, faixa que, é bom reiterar, só cresce com os agravos sócio-econômicos da pandemia. 

A prioridade à população “em situação de vulnerabilidade” sustentada pela 3877/2006 está muitíssimo longe de atender o conjunto das famílias apontadas no levantamento da FGV.

Quem é chamado pela lista da CODHAB tem que sujeitar a pagar vultosos valores às construtoras, a título de ágil para acessar unidades, como no Itapoã Park, e quem não tem condições de pagar perde a vez e vai pro final na fila.

O Governador do DF estende o seu negacionismo sanitário à realidade sócio-econômica do Distrito Federal. Construir viaduto é prioridade! 

Garantir condições dignas de vida para essas 300 mil famílias, considerando as necessidades de alimentação, moradia, saúde, educação, mobilidade etc. não é prioridade para o milionário Governador de Brasília!!

Projeto de moradia popular que mereça esse nome, o que não é o caso do Habita Brasília (da Codhab), deve considerar a faixa de renda da família beneficiada, bem como seu local tradicional de moradia (um núcleo familiar enraizado por várias gerações em uma cidade, deve ter preferência para acesso à moradia popular em sua própria cidade e/ou próxima ao local de trabalho).

Desgraçadamente, o único planejamento que o governador do DF se permite fazer é o seu “planejamento eleitoral” para o ano que vem. 

Planejar a ocupação do território, o reordenamento territorial do DF, priorizando a renda básica cidadã, a moradia popular, estimulando projetos de mutirão autogestionário, é uma necessidade urgente!

 E mais: aumentar o IPTU dos imóveis ociosos no DF (por volta de 100 mil) direcionando a arrecadação para projetos de construção de moradia e infraestrutura com espaços para pontos de trabalho e bases de serviço, de maneira que a comunidade possa “empreender” coletivamente por meio de núcleos coletivos e solidários por ramo de atividade econômica. 

Se esses recursos forem aportados ao FUNDHIS (Fundo Distrital de Habitação de Interesse Social) que sejam discriminados contabilmente para atendimento exclusivo da população enquadrada como faixa 1.

O negacionismo só agrava os problemas, não só na saúde, como também nos indicadores sócio econômicos. 

Precisamos de um governo no Buriti que consiga enxergar as contradições e antagonismos sociais para além de sua própria bolha social e dos limites do assistencialismo.

*Afonso Magalhães é Economista e Coordenador de Direitos Humanos e Relações Internacionais da Central de Movimentos Populares (CMP-DF)

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato DF

Edição: Márcia Silva